
No projeto, com quatro apartamentos por andar, também já aparece uma área de circulação principal independente da área de serviço, característica do apartamento brasileiro até hoje, apesar das leis contra a discriminação no uso dos elevadores.
Na fachada e no saguão principal, o Seabra é típico da arquitetura eclética, o estilo que rompeu com a ortodoxia do modelo clássico e embaralhou ordens de proporção, ornamentos e composições bem definidas.
O ecletismo apareceu na metade do século XVIII, quando o excêntrico Horace Walpole criou uma salada estilística no projeto da residência de seu pai, o primeiro-ministro da Inglaterra Robert Walpole. Depois dele, principalmente no século XIX, o estilo percorreu o mundo ocidental e deu asas à imaginação de projetistas e clientes “criativos”.
Desenhado por Mario Votret, o Seabra possui, predominantemente, elementos toscanos. Mas se podem observar outras influências, como a semelhança com os edifícios de Louis Sullivan, principal arquiteto da escola de Chicago, que difundiu a idéia do arranha-céu. Há ainda outra curiosidade: as venezianas são do tipo “Copacabana”, popularizadas na verticalização do bairro. Ou seja, é um verdadeiro “samba do crioulo doido”.
Quando o chique era morar no Flamengo, o comendador português Gervásio Seabra trouxe da Itália um arquiteto para fazer o projeto do que seria o segundo edifício construído na Praia do Flamengo, cópia de um castelo da Toscana pelo qual ele se apaixonara. O arquiteto usou (e abusou) de sua imaginação, e o prédio ficou conhecido como o Dakota carioca, em oposição ao prédio nova-iorquino onde John Lennon tinha um apartamento.
A portaria pode ser descrita como psicodélica. As paredes são todas pintadas com motivos os mais diversos, o chão é de mármore – importado, claro –, fazendo desenhos, diferentes uns dos outros, as paredes são feitas com óleo de baleia, e um imenso lustre de ferro coroa a obra. Por fora, o prédio é cinza-escuro, quase preto. O comendador e sua esposa, dona Assunta, moravam nos três últimos andares, de 800 metros quadrados cada, e tinham sua portaria particular, onde um elevador privativo os levava ao lar.
Dona Assunta gostava de freqüentar os cassinos do Rio; quando entrava, dizia-se que, se as luzes se apagassem, suas jóias eram tantas, de tal porte, e brilhavam tanto, que iluminariam todo o salão.Os dois filhos do casal, Nelson e Roberto, eram doidos por corridas de cavalos. Dessa paixão surgiu o Stud Seabra; era deles a égua Tirolesa, ganhadora do Grande Prêmio Brasil de 1950. As selas de seus cavalos e as camisas dos jóqueis vinham todas de Paris, da Maison Hermès.
Outra das paixões de Nelson era participar de leilões e comprar antiguidades. Uma das catorze salas do apartamento tinha prateleiras em todas as paredes para abrigar apenas objetos de prata – insólitos, por sinal. Eram apenas 452.
Durante anos, Nelson morou em Paris, no Hotel George V, mas passava o mês de julho no Rio, para cuidar dos negócios. Era assim: quando ele ia para Paris, uma empresa de mudanças embalava todos os quadros e objetos de arte, e levava para o guarda-móveis; dez dias antes de ele chegar, tudo era recolocado nos seus lugares, através de fotos de cada canto do apartamento.
A utilizaç ão de elementos da linguagem toscana em edifícios com grande número de
pavimentos é rara no ambiente carioca.
Os Seabra recebiam constantemente a visita de Carmem Miranda, que era amiga do casal.